Tintin, Super-Homem, Malan,Armínio Fraga, e eu
Em 14 de julho de 2000, eu me encontrava preso no Aeroporto de Brasília, aguardando um vôo atrasado para Congonhas. E como em toda sexta-feira está tudo mundo tentando deixar Planalto Central.
Para passar o tempo, estava imerso no arco do Super-Homem "Emperor Joker", de Joe Kelly e Jeph Loeb, lendo na versão original em inglês, como sempre fiz, para apreciar totalmente as nuances da narrativa dos quadrinhos americanos.
Um homem de terno preto se senta ao meu lado e, ao notar o gibi, puxa conversa. Perguntou por que eu estava lendo em inglês. Expliquei minha preferência por consumir quadrinhos em seu idioma original, a fim de captar o tom autêntico e a escrita dos autores.
Foi só então que percebi que estava conversando com Arminio Fraga, então presidente do Banco Central do Brasil.
Ele comentou que eu parecia muito jovem para o ambiente político de Brasília e perguntou o que eu fazia por ali. Contei que era engenheiro de software de São Paulo e que estava trabalhando no projeto da urna eletrônica brasileira.
Ele me parabenizou pela importância e pelo sucesso do projeto. Também mencionou que seu colega, Pedro Malan, então ministro da Fazenda, era fã dos quadrinhos de Tintin, do belga Hergé, e lia as aventuras em francês. Fraga disse que Malan iria gostar do fato de que um fã do Homem de Aço estava contribuindo para uma iniciativa democrática tão relevante. Perguntei o que o "patrão" deles e professor de sociologia, FHC, diria sobre isso. Rimos juntos.
Pouco depois, um grupo de repórteres de TV o cercou, encerrando nossa conversa. Fraga se levantou, se despediu com um “tchau” e partiu. Mas o encontro, claro, deixou uma impressão duradoura em mim.
Pulo rápido para julho de 2001, eis que o próprio Malan em entrevista no "Programa do Jô", não apenas confirmando ser fã de Tintim, mas também dizendo que aprendeu francês lendo justamente esses quadrinhos na juventude. Chegou a brincar que venderia sua coleção, desde que fosse pago em francos franceses! Moeda que já não existia.
Quadrinhos não são apenas entretenimento. São janelas para o idioma, para a história e até a diplomacia. E, às vezes, são o elo que conecta duas pessoas de terno num aeroporto. Foi um momento surreal em que cultura pop, tecnologia, serviço público se cruzaram da forma mais inesperada possível.
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